CORREIO DA MANHA
"Proibido perseguir
João Relvas, Lusa
O comandante-geral da Brigada de Trânsito quer evitar prejuízos maiores do que o mal que se pretende proteger
Os militares da Brigada de Trânsito da GNR estão proibidos de perseguir condutores que não obedeçam ao sinal de paragem, bem como de recorrer a arma de fogo para os imobilizar, na sequência de uma nota interna difundida para todos os destacamentos e subdestacamentos pelo comandante da força, major-general Meireles de Carvalho.
De agora em diante, em situações de mera desobediência ao sinal de paragem, os militares devem limitar-se a anotar o número da matrícula do veículo e a alertar o comando respectivo, com vista à intercepção do condutor em fuga por outra força já preparada para o efeito.
O comandante da Brigada de Trânsito (BT) informa que o recurso à perseguição só será admitido face a suspeitas fundamentadas e nas excepções claramente protegidas por lei. É o caso de fugitivos já identificados e ameaças à vida dos agentes ou de terceiros. A nota interna, difundida a 6 de Outubro, não agradou a vários militares da BT ouvidos pelo Correio da Manhã, que perguntam: como saber se o condutor que desobedece à ordem é um cidadão inofensivo ou um perigoso criminoso?
“O sr. comandante quer evitar danos e processos disciplinares, mas na prática isto não vai resultar. É mais uma acha para a desmotivação do pessoal. Estamos de mãos atadas e quem prevarica sai impune”, criticou Virgílio Ministro, da Associação dos Profissionais da Guarda. Para o dirigente, as excepções resumem-se às ameaças aos militares ou a civis, por exemplo com arma de fogo.
De acordo com o major João Faria, porta-voz da BT, a nota interna não visa proibir, mas alertar, e surge após vários acidentes envolvendo meios da unidade: “Tem de ser salvaguardada a segurança dos militares, do condutor, dos passageiros e de outros utentes da via. Não podemos permitir que uma mera desobediência termine com uma morte”.
Questionado sobre como avaliar a perigosidade do fugitivo, o major garante que “há indícios que permitem aos militares a distinção, como o tipo de condução e de viatura e o comportamento dos ocupantes”.
O QUE DIZ O DOCUMENTO
A nota interna n.º 3058 refere no ponto 6: “Tendo em conta que as perseguições podem ser geradoras de um mal maior do que o bem que se pretende proteger (...) ficam expressamente proibidas as perseguições e, consequentemente, o recurso a arma de fogo, salvo nas situações claramente protegidas por lei.
Em situações de mera desobediência ao sinal de paragem, ainda que na sequência de observação/infracção, o procedimento deve limitar-se à anotação do número da matrícula do veículo em fuga, seguindo-se as diligências possíveis no sentido de alertar o dispositivo (...) tendo em vista a eventual intercepção do veículo por outra força já preparada para o efeito”.
A perseguição só é admitida face a suspeitas firmes, por exemplo, indivíduos já identificados ou atentados à vida dos agentes e de civis.
LAGARTAS EM EQUAÇÃO
A utilização de lagartas com espigões para travar a marcha de veículos em fuga é desaconselhada num parecer da Inspecção-Geral da Administração Interna, por ser uma medida coerciva que representa um risco para os condutores. No entanto, a Brigada de Trânsito (BT) da GNR está a estudar a possibilidade de recorrer a esse mecanismo em circunstâncias especiais, revelou ontem o major João Faria.
A PSP já equacionou o mesmo, em 2003, depois da morte de um agente atropelado numa barreira policial no Algarve. O então director nacional, Mário Morgado, chegou a admiti-lo para casos de desobediência reiterada e grave, mas a medida não avançou.
Segundo o major João Faria, a BT está a estudar o assunto e equaciona lagartas como as usadas pela GNR no Iraque. É um passadiço accionado à distância que liberta vários espigões que vão fixar-se nos pneus, causando o esvaziamento progressivo e a paragem do veículo em poucos metros.
FUGA À POLÍCIA
CAUSAS
De acordo com a Brigada de Trânsito, os condutores fogem ao sinal de paragem pelas seguintes razões: não terem carta, não terem seguro ou inspecção da viatura em dia; estarem embriagados ou em situação ilegal no país; transportarem material comprometedor; terem antecedentes criminais ou mandado de captura contra eles; circularem em veículo furtado ou sem registo de propriedade regularizado.
CONSEQUÊNCIAS
Alguns casos recentes de perseguições policiais terminaram com ferimentos, mortes e prejuízos materiais. Em Setembro, no Algarve, um homem de 40 anos foi detectado pela PSP em contramão e na fuga tentou atropelar um agente e abalroou cinco viaturas, três delas da polícia, até ser imobilizado. Três dias antes, em Braga, dois agentes da PSP tinham sido feridos a tiro ao perseguirem um veículo no âmbito de uma operação de rotina. Em Agosto, em Matosinhos, um motociclista que tinha passado vários sinais vermelhos, foi perseguido pela PSP e morreu ao colidir com um carro. Em Alvor, em Agosto, a fuga de um jipe furtado foi travada por um acidente com o carro da BT.
Cláudio Garcia, Leiria"